Nos últimos anos, a paisagem das bebidas mais consumidas na China começou a ganhar novas cores e aromas. Tradicional reduto do chá, o país asiático tem testemunhado uma transformação silenciosa, porém expressiva, no consumo de café. Estimulada por uma juventude urbana cada vez mais conectada com as tendências globais e por redes locais de cafeterias em franca expansão, a demanda pela bebida cresce a um ritmo acelerado de 10% ao ano — com expectativas de manter esse fôlego até o fim da década.
Nesse cenário, o Brasil surge como um dos principais protagonistas. A recente habilitação de 183 novas empresas brasileiras para exportar café à China, oficializada em agosto, sinaliza uma mudança estratégica na rota das exportações nacionais. A medida veio em um momento delicado, logo após os Estados Unidos elevarem para 50% as tarifas sobre alguns produtos brasileiros, incluindo o café. Assim, o mercado chinês, ainda pouco explorado em termos de volume, ganha peso nas projeções do agronegócio brasileiro.
Cultura do chá e a ascensão do café: uma mudança geracional
Embora o chá ainda ocupe posição privilegiada na mesa dos chineses, o café tem conquistado novos espaços graças à combinação de fatores culturais, econômicos e comportamentais. Nas grandes cidades, é cada vez mais comum ver jovens se reunindo em cafeterias modernas, muitas delas com decoração minimalista, cardápios criativos e uma pegada voltada ao lifestyle global. A busca por experiências sensoriais diferenciadas e o status associado ao consumo de cafés especiais impulsionam esse movimento.
Um dos termômetros mais simbólicos dessa virada cultural é a Yunnan International Coffee Expo, feira que reúne milhares de compradores profissionais e que tem atraído atenção internacional. Realizada na província de Yunnan — responsável por 98% da produção nacional de café —, o evento consolida a região como o coração da cafeicultura chinesa. Metade desse volume sai da cidade de Puer, polo reconhecido pela qualidade dos grãos e pelo esforço em agregar valor ao produto local.
Brasil e China: aproximação estratégica no mercado cafeeiro
Com o avanço da demanda, surgem também as parcerias comerciais. Um exemplo recente e emblemático foi a assinatura de contrato entre produtores brasileiros e a Luckin Coffee, maior rede de cafeterias da China. O acordo representa mais do que uma transação: simboliza o reconhecimento da qualidade e da escala de produção brasileira como diferencial competitivo frente a outros países exportadores.
Além disso, a entrada massiva de empresas brasileiras no radar da China revela uma estratégia mais ousada de longo prazo. O país asiático se mostra aberto a diversificar seus fornecedores, principalmente à medida que seus consumidores passam a valorizar mais a origem, os métodos de torra e as características sensoriais do café. Essa abertura representa uma avenida de oportunidades para o Brasil, que além de ser o maior produtor mundial, também investe cada vez mais na segmentação de mercado e na exportação de cafés especiais.
Uma mudança de rota que pode redefinir o futuro do setor
Ainda que o consumo per capita de café na China esteja distante dos patamares ocidentais, o volume total movimentado pelo país é suficiente para causar impacto em qualquer mercado global. E é justamente esse potencial que começa a ganhar protagonismo nos planos dos exportadores brasileiros. Com políticas comerciais ativas, ampliação das habilitações e novos contratos com gigantes do varejo chinês, o café brasileiro passa a traçar novos caminhos, em um dos mercados mais promissores do mundo.
A aposta é que o avanço da cultura do café entre os chineses se torne irreversível, especialmente entre os consumidores mais jovens. Nesse movimento, o Brasil encontra uma oportunidade rara: não apenas suprir uma demanda crescente, mas participar ativamente da construção de um novo capítulo da história global do café.