O Brasil, já consolidado como um dos maiores produtores mundiais de soja, agora revela outra dimensão dessa liderança: a transformação silenciosa e consistente do seu mercado de trabalho. Um estudo inédito apresentado no 64º Congresso da European Regional Science Association (ERSA), em Atenas, lança luz sobre as mudanças profundas na cadeia da soja e do biodiesel, tanto em número de empregos quanto em qualidade da mão de obra.
A pesquisa foi conduzida pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP, em parceria com a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), e revela que, entre 2012 e 2024, o número de trabalhadores na cadeia produtiva da soja dobrou, atingindo a marca de 2,26 milhões de pessoas. Mais do que o volume, o que impressiona é a sofisticação crescente desse contingente.
Avanço expressivo no campo e valorização dos salários
Embora o setor de serviços continue liderando a absorção de mão de obra — com um salto de 793 mil para 1,6 milhão de trabalhadores no período — foi no segmento primário, ou seja, diretamente na lavoura, que se observou o maior avanço proporcional: 118% de crescimento. O setor industrial também teve expansão relevante, alcançando quase 90 mil trabalhadores, com aumento de 56% no período analisado.
Essa expansão se deu acompanhada de uma valorização real dos salários. Na produção agrícola da soja, os rendimentos médios subiram 37% em termos reais entre 2012 e 2024. Na indústria, a alta foi de 22%, o que reforça a tendência de que a qualificação técnica e a formalização caminham lado a lado no setor.
Escolaridade em alta e força de trabalho formalizada
Outro dado que reforça a profissionalização da cadeia da soja está na elevação dos níveis de escolaridade. Em pouco mais de uma década, a parcela de trabalhadores com ensino médio completo passou de 32,8% para 40,2%, enquanto o número de pessoas com nível superior saltou de 12% para 20,2%. Essa mudança reflete não apenas o aumento na exigência técnica dos postos de trabalho, mas também o investimento crescente em capacitação nas regiões produtoras.
A predominância masculina ainda é uma característica do setor, com as mulheres representando cerca de 35% da força de trabalho — uma taxa estável entre 2012 e 2024. Em contrapartida, a formalização permanece em alta, com 77% dos trabalhadores contratados com carteira assinada, índice que se manteve estável ao longo da série histórica, indicando um setor que avança sem abrir mão da legalidade trabalhista.
Sul lidera o campo, mas Centro-Oeste concentra expansão recente
Do ponto de vista geográfico, a região Sul do Brasil ainda lidera na ocupação ligada diretamente ao campo. Em 2021, chegou ao pico de 293 mil trabalhadores no segmento primário. Entretanto, esse número caiu para 245 mil em 2023, refletindo uma possível desaceleração na geração de empregos ou uma mecanização mais acentuada.
Já o Centro-Oeste se consolida como polo de expansão, com quatro microrregiões concentrando 40% da mão de obra do setor entre 2022 e 2024: Sudoeste de Goiás, Dourados (MS), Campo Novo do Parecis e Alto Teles Pires (MT). Esse movimento reforça o protagonismo crescente dessa região na produção de grãos e na atração de investimentos em infraestrutura e agroindústria.