O Brasil colhe, todos os anos, milhões de toneladas de laranja — fruto essencial para a economia e símbolo de extensos pomares que embelezam regiões produtoras como São Paulo e Paraná. Entretanto, por trás dessa produção de impacto global, esconde-se uma preocupação crescente: a presença de resíduos de pesticidas em partes sensíveis da planta, como o pólen. Agora, uma nova técnica desenvolvida por cientistas da Unicamp e da Embrapa Meio Ambiente promete revolucionar esse tipo de análise, com mais eficiência, menor custo e impacto ambiental reduzido.
Essa inovação surge num contexto em que o uso intensivo de agroquímicos, especialmente os da classe dos neonicotinóides, tem gerado polêmicas em diversos países. Essas substâncias persistem na planta mesmo após a aplicação e acabam alcançando estruturas delicadas, como flores e pólen — um problema que ameaça diretamente os polinizadores, sobretudo as abelhas.
Um avanço técnico com precisão e sustentabilidade
Batizada de micro-QuEChERS, a técnica utiliza 100 vezes menos amostras que os métodos convencionais e consome dez vezes menos reagentes. Ou seja, é uma ferramenta que reduz drasticamente os resíduos químicos gerados durante a análise e reforça os princípios da química verde. Ao mesmo tempo, consegue identificar e quantificar resíduos de pesticidas com alto grau de exatidão, graças à associação com equipamentos avançados de cromatografia líquida de ultra eficiência e espectrometria de massas (UHPLC-MS/MS).
Com apenas 100 mg de pólen, o método é capaz de detectar traços de compostos como imidacloprido, clotianidina, tiametoxam, abamectina, azoxistrobina e carbendazim — nomes que figuram entre os pesticidas mais usados nos pomares cítricos brasileiros.
Polinizadores em risco: uma ameaça silenciosa
A presença de pesticidas no pólen não é um detalhe técnico. Ela impacta diretamente a saúde das abelhas, responsáveis pela polinização de uma ampla variedade de culturas agrícolas. A ingestão de néctar e pólen contaminados pode provocar sintomas como desorientação, perda de capacidade de navegação e, em casos mais graves, morte dos insetos.
Esse efeito devastador já é conhecido na comunidade científica internacional. Tanto que, desde 2018, a União Europeia impôs severas restrições ao uso de neonicotinóides. No Brasil, o movimento para limitar essas substâncias só começou em 2022, ainda com uso permitido em diversas lavouras.
A inovação proposta pelos pesquisadores nacionais oferece, portanto, uma alternativa poderosa para monitorar e compreender melhor os efeitos desses produtos nas cadeias agrícolas, sem comprometer a saúde dos polinizadores.
Menor custo, maior acesso e resultados confiáveis
Outro ponto que torna a nova técnica especialmente promissora é sua viabilidade em larga escala. Como o método exige menos insumos e utiliza equipamentos já presentes na maioria dos laboratórios de análise de agrotóxicos, sua aplicação pode se tornar rapidamente disseminada. Isso significa que centros de pesquisa e instituições públicas terão acesso a dados mais precisos, com menos custo e menos geração de resíduos.
O processo também atende aos rigorosos critérios da diretriz SANTE, da Comissão Europeia, que valida a confiabilidade das análises. Assim, os resultados obtidos são livres de interferências causadas pelo próprio pólen — algo que representa um grande desafio em métodos tradicionais.