O futuro do agronegócio já está em andamento — e ele é mais tecnológico, acessível e inteligente do que se imagina. Em uma iniciativa que une ciência, inovação e prática rural, pesquisadores da Universidade Federal do Pampa (Unipampa), em colaboração com a Embrapa Pecuária Sul, têm desenvolvido um sistema baseado em inteligência artificial (IA) capaz de transformar o manejo animal e o controle de pragas em fazendas brasileiras.
Agora, com o reforço da gigante Nvidia, líder global em soluções computacionais, o projeto entra em uma nova fase: mais rápida, mais precisa e mais próxima da realidade do produtor rural.
Da contagem de carrapatos ao alerta no celular
Uma das aplicações mais promissoras já em funcionamento é o sistema de contagem automática de carrapatos no gado. A tecnologia funciona com base em imagens captadas por câmeras instaladas em pontos estratégicos da propriedade — como bebedouros ou corredores de manejo. Assim que o animal é identificado pela câmera, um algoritmo previamente treinado realiza a contagem instantânea dos parasitas com até 94% de precisão, segundo os pesquisadores.
O resultado é surpreendente: um processo que antes dependia do olhar atento de um funcionário da fazenda, com risco de erro humano e alto custo de tempo, agora acontece de forma autônoma, diretamente no smartphone ou em um minicomputador no campo. “O produtor pode programar para ser notificado apenas quando um animal apresentar mais de dez carrapatos, por exemplo”, explica o coordenador do projeto, Sandro Camargo.
Melhoramento genético com apoio da visão computacional
A inteligência artificial também está sendo aplicada para aprimorar o melhoramento genético de bovinos, especialmente das raças Hereford e Braford. O foco está na seleção de animais menos sensíveis à exposição solar — uma característica valiosa em regiões de alta radiação, onde o gado tende a procurar sombra, interrompendo a alimentação e perdendo peso.

Hoje, essa avaliação é feita manualmente por técnicos, que atribuem notas de 1 a 5 para o nível de pigmentação ao redor dos olhos. Mas o novo modelo de IA já é capaz de realizar essa análise com um simples clique. A câmera do celular ou de um equipamento fixo registra a imagem do animal e, em segundos, o sistema entrega o escore de pigmentação, eliminando falhas humanas e acelerando as decisões sobre acasalamento e seleção genética.
Diagnóstico precoce de doenças sem intervenção humana
Outra frente em desenvolvimento mira a detecção precoce de doenças como ceratoconjuntivite e anemia bovina. Ambas as condições, que afetam diretamente a produtividade e a saúde do rebanho, muitas vezes só são percebidas em estágios avançados. A nova tecnologia, no entanto, propõe algo mais eficiente: um dispositivo fixo no campo que identifica, fotografa e analisa o animal durante sua passagem por corredores de contenção.
Em questão de segundos, o algoritmo treinado aponta sinais da enfermidade — mesmo sem sintomas comportamentais visíveis. “É a esse ponto que chegaremos em breve. Tudo de forma automática”, afirma Camargo, ao destacar que o dispositivo pode ser alimentado por energia solar e custar entre R$ 700 e R$ 800, tornando a solução viável até para pequenos produtores.
Menos tempo, mais resultados com supercomputação
Por trás da sofisticação dos modelos de IA, há uma demanda imensa por poder computacional — e foi justamente nesse ponto que a parceria com a Nvidia se tornou decisiva. Com acesso à infraestrutura de supercomputação da empresa, os pesquisadores reduziram o tempo de treinamento dos algoritmos de semanas para poucos minutos. Isso abre espaço para ajustes mais finos, testes variados e o desenvolvimento de novas funcionalidades com agilidade antes inimaginável.

As imagens que alimentam os sistemas são coletadas nas estações da Embrapa, totalizando milhares de registros processados individualmente. O ganho de desempenho permite que os pesquisadores avancem para desafios mais complexos com mais segurança e velocidade.
Agricultura de precisão também entra na era da IA
Embora os primeiros testes estejam concentrados na pecuária, os benefícios da tecnologia também se estendem à agricultura. Uma das soluções em fase de teste é a detecção automática do capim-annoni, espécie invasora que afeta pastagens no Sul do país e pode gerar infestações com alta capacidade de propagação.
Com um modelo de IA específico, o sistema já é capaz de analisar 350 imagens por minuto, com precisão próxima a 90%. A expectativa é atingir níveis de acerto superiores a 98%, o que tornará viável o controle precoce dessa e de outras pragas — como o caruru — por meio de simples varreduras visuais feitas com câmeras acopladas a drones ou dispositivos de campo.
Um futuro inteligente e sustentável no campo
Com soluções portáteis, conectadas e eficientes, o projeto “Terrapampa Smart Systems” está redefinindo a forma como o produtor rural brasileiro lida com o manejo do rebanho, a saúde animal e a qualidade das pastagens.
“É só uma questão de tempo para a gente chegar nesse resultado”, afirma Camargo, ao destacar que os produtos já estão sendo testados com sucesso em campo pela Embrapa e devem chegar ao mercado em breve. A proposta é simples: baixíssimo custo, fácil instalação e impacto direto na produtividade.