O ano mal passou da metade, mas o rastro das queimadas florestais já se mostra devastador para a vida animal em São Paulo. Com 17 casos confirmados de animais silvestres feridos ou mortos em decorrência direta do fogo, a situação escancara uma urgência ambiental que não pode mais ser ignorada.
Em meio a esses episódios, o caso que mais comoveu foi o de uma anta resgatada em um canavial em Teodoro Sampaio, no Pontal do Paranapanema, com cerca de 70% do corpo tomado por queimaduras. Apesar dos esforços e do tratamento intensivo, o animal não resistiu aos ferimentos, tornando-se símbolo da fragilidade da fauna frente à expansão do fogo em áreas naturais e agrícolas.
Espécies ameaçadas e centros de reabilitação sobrecarregados
Os números reportados por centros especializados vinculados à Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística (Semil) revelam que a biodiversidade paulista sofre em múltiplas frentes. Em Assis, por exemplo, a Associação Protetora de Animais Silvestres (Apass) recebeu uma leva de vítimas composta por cinco cachorros-do-mato, dois veados-catingueiros, um furão, um ouriço-cacheiro, além de aves como urubu, gavião-carijó e pomba-asa-branca. As queimaduras intensas causaram a morte de parte dos resgatados, incluindo o furão e o ouriço, reforçando a dificuldade de recuperação quando há comprometimento extenso dos tecidos.

A região de Ribeirão Preto, fortemente marcada por áreas de transição entre vegetação nativa e agricultura, também registrou ocorrências. O Centro de Triagem e Reabilitação de Animais Silvestres (Cetras) acolheu dois urubus e um tapicuru — ave conhecida como galo-do-bico-fino. Já em São Roque, um filhote de gato-do-mato chegou debilitado ao Centro de Reabilitação de Animais Silvestres (CRAS) após ser encontrado às margens da Rodovia Raposo Tavares, também em área recentemente atingida por incêndio.
Ações integradas e resposta emergencial
Segundo a coordenadora de Gestão dos Cetras, Liliane Milanelo, o cenário atual comprova a necessidade de integração entre diferentes frentes, como brigadistas da Fundação Florestal, Polícia Ambiental e centros especializados. Essa mobilização conjunta é essencial não apenas para o resgate imediato, mas também para garantir protocolos adequados de tratamento, reabilitação e — quando possível — reintegração das espécies à natureza.
Em 2024, o número de resgates havia sido ainda mais expressivo: foram 94 registros, dos quais 53 resultaram em morte. Apenas duas vítimas conseguiram ser reabilitadas e devolvidas ao seu habitat natural. As demais seguem sob tratamento contínuo, muitas vezes por meses, nos centros distribuídos pelo estado.
Curso gratuito oferece capacitação sobre manejo em queimadas
Para ampliar a rede de apoio e preparar mais profissionais e voluntários para o resgate de animais em áreas queimadas, o governo do Estado de São Paulo lançou recentemente um curso online gratuito, parte da Operação São Paulo Sem Fogo. A capacitação, disponibilizada por meio do portal de Educação Ambiental da Semil, traz conteúdos sobre prevenção, preparação e resposta a incêndios que envolvem fauna silvestre e doméstica.
O curso é aberto a todos os interessados — incluindo equipes de prefeituras e organizações civis — e não exige inscrição. Composto por dez aulas de cerca de uma hora cada, o material será liberado de forma escalonada até 17 de setembro. Atualmente, três módulos já estão disponíveis para acesso imediato.
Ao final do curso, os participantes poderão obter um certificado, desde que respondam corretamente a pelo menos 80% das questões aplicadas sobre o conteúdo. A iniciativa representa um passo importante para disseminar conhecimento técnico e estimular práticas de resgate mais eficazes, sobretudo em um cenário de aquecimento global e avanço das queimadas no território paulista.