Resumo
Pesquisadores da UFU, USP e Furb identificaram piolhos e carrapatos como principais vetores da varíola dos ouriços, causada pelo vírus BPoPV.
O vírus, descrito em 2021, provoca lesões graves e alta mortalidade em ouriços-cacheiros no Brasil e na Argentina.
Apesar da gravidade, o BPoPV não é uma zoonose confirmada, mas cientistas alertam para possíveis mutações futuras.
O DNA do vírus foi detectado em todos os ouriços infectados e em seus parasitas, reforçando o papel desses vetores.
O estudo destaca a importância do monitoramento da fauna e do controle de parasitas para evitar novos surtos.
Um recente estudo conduzido por pesquisadores da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), em parceria com a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade Regional de Blumenau (Furb) e a Universidade de Bari (Itália), trouxe novas evidências sobre a origem e propagação da varíola dos ouriços brasileiros. O trabalho identificou que piolhos e carrapatos atuam como principais vetores do vírus responsável pela doença — o Brazilian porcupinepox virus (BPoPV) —, apontando uma conexão direta entre os parasitas e a disseminação da enfermidade em populações silvestres.
Descrito pela primeira vez em 2021 pela docente Aline Santana da Hora, da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UFU, o vírus tem sido associado a lesões cutâneas severas e alta taxa de mortalidade em ouriços-cacheiros (Coendou longicaudatus e Coendou spinosus), afetando animais em diversos estados do Brasil e também na Argentina. O estudo foi publicado na revista científica Pathogens e reforça a urgência de compreender o papel ecológico e epidemiológico desses parasitas na transmissão do vírus.
Doença grave, mas sem risco confirmado ao ser humano
Apesar da semelhança nominal com outros vírus do grupo das poxviroses, o BPoPV não é o mesmo agente causador da varíola humana, erradicada mundialmente através da vacinação, nem possui relação direta com o monkeypox. Atualmente, os pesquisadores não o consideram uma zoonose, ou seja, não há evidências de transmissão para humanos.
No entanto, como se trata de um vírus descoberto recentemente, o alerta permanece. Os cientistas observam que mudanças genéticas naturais podem alterar o comportamento do patógeno, abrindo a possibilidade de adaptação a novos hospedeiros. Por isso, recomendam que qualquer pessoa que encontre um animal silvestre doente evite o contato direto e acione órgãos competentes, como a Polícia Ambiental ou o Corpo de Bombeiros.
Análises de campo e resultados laboratoriais
A pesquisa foi realizada nos laboratórios de Investigação Etiológica Veterinária (LIvE Vet/UFU) e de Ixodologia (Labix/UFU), onde os cientistas analisaram ectoparasitas coletados de 17 ouriços-cacheiros, com e sem sintomas clínicos da infecção. O DNA do vírus foi detectado em todos os animais doentes e em seus piolhos e carrapatos, com exceção de um grupo isolado de carrapatos. Esses resultados confirmam que espécies como Eutrichophilus, Amblyomma sculptum e Amblyomma longirostre podem atuar na cadeia de transmissão da varíola dos ouriços.
De acordo com Aline da Hora, já há registros de casos confirmados em Santa Catarina, Goiás, São Paulo, Mato Grosso, Paraná, Rio Grande do Sul e Distrito Federal — o que demonstra que o vírus se espalha por diferentes biomas brasileiros, atingindo animais tanto em áreas florestais quanto próximas de centros urbanos.
Impactos na fauna e importância da vigilância ambiental
Os pesquisadores alertam que a varíola dos ouriços representa um risco ecológico considerável, pois a doença ameaça espécies silvestres que desempenham papel essencial no equilíbrio ambiental. Além de reduzir populações locais, as lesões e debilidades causadas pelo vírus facilitam o ataque de predadores e o surgimento de outras infecções.
O estudo, que contou com a colaboração da doutoranda Nathana Beatriz Martins, do Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias da UFU, recebeu apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). A pesquisa reforça a necessidade de monitoramento constante da fauna silvestre e do controle de parasitas, especialmente em regiões onde os ouriços-cacheiros convivem mais próximos a áreas habitadas.



