Resumo
- A Embrapa criou um banco de dados inédito com dados físicos, químicos e sensoriais de sete espécies de pescado, visando impulsionar o mercado de proteínas alternativas no Brasil.
- As informações padronizadas incluem pH, aroma, textura e coloração, fundamentais para simular fielmente o pescado em produtos plant-based e cultivados.
- O catálogo foi integrado a plataformas globais, permitindo que pesquisadores e startups desenvolvam alimentos mais realistas e com maior aceitação sensorial.
- O estudo ajuda a compreender atributos como a estrutura das fibras musculares e os compostos aromáticos voláteis que definem a experiência do consumidor.
- Os dados reunidos devem acelerar a criação de alternativas como sushi vegano e fishburgers vegetais, aliando ciência, inovação e sustentabilidade alimentar.
A busca por alimentos sustentáveis e fiéis ao sabor do mar acaba de ganhar um aliado de peso. Em um projeto que reúne tecnologia de ponta e biodiversidade nacional, a Embrapa Agroindústria de Alimentos, em parceria com o Instituto de Estudos do Mar Almirante Paulo Moreira (IEAPM), criou o primeiro banco de dados brasileiro que detalha as propriedades sensoriais, físicas e químicas de espécies marinhas de alto valor comercial.
O trabalho representa um salto para o mercado de proteínas alternativas, com foco em peixes e frutos do mar produzidos por meio de ingredientes vegetais ou cultivo celular. A proposta é simples e ambiciosa: oferecer à indústria um retrato fiel dos alimentos do oceano, para que os produtos desenvolvidos em laboratório ou cozinha simulem com precisão o frescor, a textura e o sabor do pescado tradicional.
Mapeando o sabor do mar com precisão científica
A pesquisa analisou minuciosamente sete espécies amplamente apreciadas no Brasil: garoupa, robalo, bijupirá, dois tipos de atum (bigeye e albacora), camarão cinza e salmão-do-atlântico. O resultado é um verdadeiro “mapa genético sensorial”, capaz de orientar desde startups veganas até multinacionais da biotecnologia.
Os cientistas padronizaram protocolos para medir características como pH muscular, compostos aromáticos voláteis, coloração da carne, textura e microestrutura das fibras. Cada uma dessas variáveis interfere diretamente na percepção do consumidor ao provar um filé de peixe ou um sashimi vegetal.
A acidez, por exemplo, traduzida pelo pH, tem papel crucial na estabilidade e sabor do alimento. Já o conjunto de compostos voláteis, invisíveis a olho nu, é responsável por aquele aroma que torna o salmão tão distinto do atum ou do robalo. A textura, por sua vez, depende da espessura e da disposição das fibras musculares, o que explica por que algumas espécies se desfiam facilmente, enquanto outras oferecem resistência firme na mastigação.
Visual, aroma e textura: o tripé da fidelidade sensorial
A experiência de consumo de um pescado começa muito antes da primeira garfada. A cor da carne, no estado cru ou após o preparo, está entre os atributos mais importantes na decisão de compra e na percepção de frescor e qualidade.
Nesse sentido, o banco de dados brasileiro oferece uma riqueza de informações capaz de nortear escolhas técnicas na formulação de produtos plant-based ou cultivados. Em vez de depender de tentativa e erro, a indústria agora pode contar com referências precisas sobre cada espécie — da tonalidade da carne ao padrão de desfiamento.
Integração global e acesso aberto à inovação
Os dados gerados no Brasil agora alimentam duas plataformas internacionais mantidas pelo The Good Food Institute (GFI): o PISCES e o ATLAS, repositórios colaborativos que reúnem informações sobre espécies marinhas para orientar o desenvolvimento de alternativas ao pescado em todo o mundo.
Antes do estudo, não existia um repositório padronizado com dados sensoriais comparáveis entre diferentes espécies. As informações estavam dispersas, obtidas por métodos diversos e muitas vezes incompatíveis. A padronização adotada pela Embrapa preenche essa lacuna e posiciona o Brasil como referência em pesquisa de alimentos alternativos.
O futuro do pescado à base de plantas começa com dados
A publicação dos resultados no Catálogo de Caracterização do Pescado Marinho para a Indústria de Proteínas Alternativas marca um ponto de virada. O material serve como guia técnico para empresas que desejam desenvolver sushi vegano, fishburgers de proteína vegetal ou até salmões produzidos por cultivo celular.
A partir dessa base científica sólida, a expectativa é que o mercado ganhe não só em inovação, mas também em qualidade sensorial. Produtos mais fiéis ao sabor, à textura e à aparência do peixe tradicional tendem a ampliar a aceitação dos consumidores e abrir novos horizontes para uma alimentação mais sustentável.
Essa iniciativa também contribui para reduzir a pressão sobre os estoques pesqueiros e reforça o protagonismo do Brasil em uma das frentes mais promissoras da bioeconomia moderna. Afinal, o futuro do mar também pode nascer da terra — e, agora, com identidade bem definida.



