Se antes a agricultura familiar era sinônimo de produção de subsistência, hoje ela representa um pilar estratégico da economia gaúcha — e cada vez mais conectada à inovação, à sustentabilidade e ao mercado. No Rio Grande do Sul, o setor passou por uma transformação silenciosa, mas profunda, marcada pelo avanço da tecnologia no campo, pela qualificação dos produtores e por uma crescente consciência de seu papel essencial no abastecimento de alimentos, na geração de empregos e na preservação ambiental.
À medida que os pequenos e médios produtores investem em capacitação e buscam alternativas modernas de manejo, surgem novas oportunidades de crescimento. E não apenas em produtividade: trata-se de uma mudança estrutural, que consolida o perfil empreendedor e técnico dos agricultores familiares.
Profissionalização e acesso a máquinas transformam o cotidiano rural
Segundo Carlos Joel da Silva, presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Rio Grande do Sul (Fetag-RS), a realidade no campo mudou radicalmente na última década. “Houve uma diminuição no número de pessoas diretamente envolvidas com a agricultura familiar, mas o nível de qualificação dessas famílias aumentou consideravelmente. Hoje vemos propriedades mais enxutas, porém muito mais eficientes”, afirma.
A presença de novas tecnologias é uma das marcas dessa revolução silenciosa. Com o apoio de políticas públicas como o Programa Mais Alimentos, vinculado ao Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), os produtores passaram a ter acesso facilitado a financiamentos para aquisição de tratores, implementos e sistemas de irrigação, o que permitiu o salto de produtividade.
“Antes, era comum vermos famílias com trabalho braçal do início ao fim. Agora, muitos contam com tratores e equipamentos adaptados para a escala familiar. A própria indústria percebeu esse novo perfil e passou a desenvolver maquinário específico para atender essas propriedades”, comenta Joel.
A agricultura familiar hoje não só participa da produção de grãos como soja e milho, como também tem papel importante na pecuária leiteira e de corte, frutas, hortaliças e outros produtos fundamentais à segurança alimentar da população.
Preservar, produzir e gerar renda: o tripé da agricultura familiar
Se por um lado o campo tem se modernizado, por outro, ele não perdeu sua essência. Tradições culturais, laços comunitários e consciência ambiental seguem firmes nas rotinas das famílias agricultoras. E esse equilíbrio é o que diferencia o modelo gaúcho de produção.
Douglas Cenci, presidente da Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar do RS (Fetraf/RS), destaca que os agricultores familiares respondem por aproximadamente 27% do Produto Interno Bruto do estado e são responsáveis por mais de 670 mil empregos diretos e indiretos. “Mesmo com uma pequena parcela da terra, nossa agricultura familiar é uma das que mais geram renda e ocupação. E faz isso com equilíbrio ambiental e social”, pontua.
A convivência com o solo, a água e as nascentes é cuidadosa. A maioria das propriedades familiares adota práticas sustentáveis, como rotação de culturas, preservação de matas ciliares e uso racional da água. “É um modelo resiliente, que alia produtividade com consciência ecológica”, completa Cenci.
Apoio técnico e políticas públicas fortalecem os avanços
Esse cenário de avanço também tem como base o trabalho de assistência técnica e extensão rural, promovido por órgãos como a Emater/RS-Ascar. Luciano Schwerz, presidente da instituição, ressalta o papel fundamental de programas como o Irriga+RS e o Terra Forte, iniciativas voltadas para a melhoria da gestão hídrica e recuperação do solo nas pequenas propriedades.
“Estamos fortalecendo a resiliência climática das famílias rurais e aumentando sua capacidade produtiva. Investir na agricultura familiar é investir na segurança alimentar, no desenvolvimento regional e na sustentabilidade”, destaca Schwerz.
Aliás, esse suporte técnico tem sido fundamental para enfrentar os desafios cada vez mais presentes no campo, como o envelhecimento da população rural e os efeitos das mudanças climáticas. As capacitações oferecidas têm possibilitado a sucessão familiar e incentivado jovens a permanecerem no campo com uma nova mentalidade empreendedora.