Resumo
• Produtores brasileiros estão transformando as flores do café em chás aromáticos e funcionais, unindo tradição, sustentabilidade e inovação.
• O chá de flores do café possui antioxidantes, compostos fenólicos e cafeína moderada, com propriedades benéficas à saúde comprovadas por pesquisa científica.
• O processo de colheita e secagem é artesanal, preservando o perfume e o sabor suave das flores, que lembram notas amadeiradas e doces.
• A iniciativa reduz o desperdício e fortalece a economia circular do café, aproveitando integralmente todas as partes da planta.
• O mercado de chás cresce no Brasil e impulsiona novas oportunidades para produtores, com potencial de transformar o café em um produto ainda mais versátil.
As delicadas flores brancas que anunciam o início da safra de café estão revelando uma nova vocação. Antes vistas apenas como um sinal promissor de boa colheita, elas agora se tornam protagonistas em uma iniciativa inovadora que une tradição, ciência e sustentabilidade.
Produtores e pesquisadores brasileiros estão transformando as flores do café em matéria-prima para chás, criando uma bebida aromática, leve e funcional, que promete conquistar o paladar e ampliar as possibilidades econômicas do campo.
O aroma do cafezal que virou infusão
Na Fazenda Camocim, em Domingos Martins (ES), o perfume adocicado das flores do café agora também se traduz em sabor. O proprietário, Henrique Sloper, foi um dos pioneiros a experimentar o uso das flores em chás. Segundo ele, a curiosidade dos visitantes logo se transforma em encantamento. “Num primeiro momento, as pessoas provam por curiosidade, mas acabam levando para casa. O aroma amadeirado e levemente doce lembra o café verde e tem conquistado os consumidores”, afirma.
O processo, no entanto, exige técnica e sensibilidade. Da colheita manual à secagem natural à sombra, cada etapa é conduzida com cuidado para preservar os óleos essenciais e as notas florais. As flores são retiradas apenas após a fecundação, garantindo que a colheita não interfira na produção dos frutos. O resultado é um chá de cor clara, sabor suave e um perfume inconfundível que traduz a alma do cafezal.
Pesquisa confirma potencial funcional
Estudos conduzidos pelo Centro Universitário do Norte do Espírito Santo (Ceunes), pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pela Universidade do Porto, em Portugal, reforçam o valor dessa descoberta. A pesquisa, publicada na revista científica Foods, revela que o chá produzido com flores de café contém antioxidantes, compostos fenólicos e cafeína em níveis moderados, elementos associados à ação anti-inflamatória e à prevenção do envelhecimento celular.

Esses compostos, segundo os pesquisadores, são os mesmos responsáveis pelas propriedades sensoriais e benéficas do grão de café, o que torna o chá uma alternativa natural e funcional. “O chá de flores de café tem potencial para se consolidar no mercado de infusões especiais, por unir leveza, aroma e benefícios à saúde”, observa Sloper.
Sustentabilidade e economia circular
Além da novidade sensorial, a prática representa um passo importante rumo à economia circular do café. Tradicionalmente, as flores eram descartadas após a polinização, sem aproveitamento econômico. Agora, transformam-se em um subproduto valioso que ajuda a reduzir o desperdício e gerar renda extra para os produtores no período entre as colheitas.
O aproveitamento integral do cafeeiro — incluindo grãos, cascas, folhas e flores — vem se tornando um símbolo de inovação sustentável, alinhado à Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável da ONU. O conceito reforça que cada parte da planta pode ser explorada de forma responsável, agregando valor e promovendo práticas mais ecológicas no campo.
Expansão e experiências pioneiras
A tendência já começa a se espalhar por diferentes regiões produtoras do país. Na Casa Baldoni, em São José Alegre (MG), o chá de flor de café faz sucesso entre os visitantes da fazenda. Lá, as flores são utilizadas frescas, colhidas diretamente do pé para infusão imediata, preservando a intensidade do aroma natural — uma experiência que só pode ser vivida localmente.
Em outra frente, a marca mineira Kapeh, criada pela farmacêutica Vanessa Vilela, também encontrou nas flores de café uma fonte de inspiração. Além de desenvolver chás a partir das folhas do cafeeiro, a empresa utiliza as flores em cosméticos, aproveitando as propriedades antioxidantes da planta e reforçando o conceito de aproveitamento integral.
Um novo ciclo para o café brasileiro
O surgimento do chá de flores de café mostra que o futuro do setor vai muito além da xícara tradicional. Com aroma floral, sabor delicado e apelo sustentável, a bebida representa uma nova forma de vivenciar o café — conectando o campo à inovação, o aroma à ciência e a tradição à sustentabilidade.
No Brasil, onde o mercado de chás cresceu mais de 90% entre 2019 e 2024, segundo dados da Euromonitor, essa tendência tem potencial para florescer ainda mais, transformando o que antes era efêmero em um novo símbolo de prosperidade e cuidado com a natureza.



