Transformar as florestas tropicais em fontes de receita sustentável e instrumentos de combate às mudanças climáticas é o principal objetivo do estudo divulgado pelo Climate Policy Initiative (CPI), vinculado à Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).
O levantamento apresenta o Mecanismo de Reversão de Desmatamento (Reversing Deforestation Mechanism – RDM), que pode gerar até US$ 100 bilhões em receitas anuais para países que abrigam florestas tropicais.
Um novo paradigma para o desenvolvimento sustentável
A pesquisa, elaborada a pedido do presidente da COP30, embaixador André Corrêa do Lago, integra o chamado “Roteiro de Baku a Belém para 1,3T”, uma iniciativa internacional que busca mobilizar US$ 1,3 trilhão em investimentos voltados à transição energética e à adaptação climática.
Segundo o estudo, o RDM parte do princípio de que as florestas não devem ser vistas apenas como ecossistemas vulneráveis, mas como ativos estratégicos de valor econômico e climático. Essa nova abordagem propõe transformar a restauração florestal em um negócio rentável e sustentável, integrando conservação ambiental e geração de renda.
Juliano Assunção, diretor executivo do CPI/PUC-Rio, destaca que “ampliar a remoção de carbono da atmosfera é cada vez mais prioridade, e as florestas tropicais oferecem uma das ferramentas mais poderosas disponíveis”.
Como funciona o mecanismo
O Mecanismo de Reversão de Desmatamento propõe um sistema de pagamentos por resultados, no qual países tropicais receberiam incentivos financeiros proporcionais à quantidade de carbono removido da atmosfera. Esses recursos seriam destinados à recuperação de áreas degradadas, prevenção de queimadas e investimentos socioeconômicos em comunidades locais.
A estimativa do estudo indica que o RDM pode gerar receitas de até US$ 5 mil por hectare restaurado, com um potencial de remoção anual de 2 gigatoneladas de CO₂ — o equivalente a uma parcela expressiva das emissões globais de dióxido de carbono.
A Amazônia no centro da equação
No caso da Amazônia, o relatório aponta que a aplicação do RDM poderia inverter a trajetória atual de emissões. Em vez de liberar 16 gigatoneladas de CO₂ nos próximos 30 anos, a floresta teria potencial para capturar 18 gigatoneladas por meio da regeneração natural em larga escala. Isso representaria US$ 30 bilhões por ano em receitas apenas para a região.
Assunção ressalta que a restauração florestal pode ser mais lucrativa do que atividades de baixo rendimento, como a pecuária extensiva. “A Amazônia tem contribuição decisiva para as metas climáticas globais. Quando associada a um preço justo do carbono, a restauração se torna o uso da terra mais rentável e sustentável”, afirma.
Diferença em relação a outros modelos
Diferentemente de programas já conhecidos, como o REDD+ jurisdicional (JREDD+) e o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF), o RDM concentra-se na restauração em larga escala, e não apenas na prevenção do desmatamento. O mecanismo prevê acordos bilaterais entre governos ou instituições privadas e jurisdições nacionais ou regionais, baseados em resultados mensuráveis de captura de carbono.
Os fundos jurisdicionais criados a partir desses acordos seriam responsáveis por administrar os recursos e garantir que os investimentos cheguem às comunidades e projetos locais, fomentando iniciativas de reflorestamento, educação ambiental e inclusão social.
Potencial global e impacto econômico
De acordo com o CPI/PUC-Rio, os 91 países tropicais analisados abrigam 1,27 bilhão de hectares de florestas, que armazenam o equivalente a um terço das emissões históricas globais de CO₂. Restaurar as áreas degradadas desde 2001 poderia recapturar até 49 gigatoneladas de CO₂, demonstrando o imenso potencial desse modelo para frear o aquecimento global e estimular economias verdes.
Para Juliano Assunção, “a restauração em larga escala pode transformar milhões de hectares degradados em ativos climáticos, mas isso só será possível com financiamento internacional robusto e de longo prazo. A COP30 é uma oportunidade única para consolidar uma arquitetura financeira capaz de valorizar o papel das florestas tropicais na agenda climática global.”
O estudo reforça que o RDM pode se tornar um divisor de águas na economia verde dos países tropicais, conciliando desenvolvimento, conservação e justiça climática — uma equação que redefine o valor das florestas no século XXI.