O mel orgânico produzido no semiárido piauiense, reconhecido mundialmente pela pureza e qualidade, enfrenta uma das maiores crises de sua história recente. Após a imposição de novas tarifas pelos Estados Unidos, principal destino da produção nacional, o setor apícola do estado vive uma onda de cancelamentos, incertezas e prejuízos que já ultrapassam cifras milionárias.
A cadeia produtiva, que envolve desde pequenos produtores rurais até grandes grupos exportadores, teme pelo colapso se medidas emergenciais não forem adotadas com urgência.
Cancelamentos e prejuízos atingem a base da cadeia
Desde o início da vigência das novas tarifas, em 6 de agosto, contratos firmados com compradores norte-americanos começaram a ruir. Um dos maiores grupos exportadores da região, que antes liderava o envio de mel orgânico da América do Sul, já acumula perdas superiores a 850 mil dólares. O impacto não ficou restrito aos embarques: contratos inteiros foram anulados, criando um vácuo comercial justamente no auge do período de escoamento.

Para mitigar o impacto sobre os produtores locais, empresas da cadeia tentam, até o momento, manter os pagamentos aos apicultores. O valor por quilo, que girava em torno de R$ 16 antes do tarifaço, caiu para R$ 15 — uma queda que já pressiona a sustentabilidade das atividades nas comunidades envolvidas com a produção.
Entretanto, essa contenção pode não durar muito. A permanência da tarifa combinada à ausência de novas rotas de exportação coloca em risco a capacidade de manter os compromissos assumidos com fornecedores e empregados. Além disso, a estagnação do mercado americano tem incentivado compradores de outros países a oferecerem preços mais baixos, aproveitando o enfraquecimento da posição comercial brasileira. É uma reação em cadeia que ameaça desestabilizar todo o setor.
Falta de resposta rápida amplia o caos
Com o cenário se agravando dia após dia, o setor esperava uma resposta célere do poder público. No âmbito estadual, há esforços em andamento para liberar créditos de ICMS e estudar a criação de um fundo de compensação tributária, que poderia suavizar os efeitos da nova alíquota e preservar a competitividade do mel piauiense no exterior. No entanto, até agora, nenhuma medida foi efetivamente colocada em prática — o que amplia o sentimento de insegurança.
No plano federal, um pacote emergencial chegou a ser anunciado, mas sua aplicação ainda é nebulosa. As empresas impactadas alegam não saber como acessar os recursos prometidos, tampouco de que forma o auxílio será distribuído. Enquanto isso, as obrigações financeiras continuam se acumulando: folha de pagamento, combustíveis, logística e tributos tornam-se desafios diários para os empreendedores locais.
Mercado em risco: futuro da apicultura em xeque
A apicultura do Piauí representa não apenas uma fonte de renda para milhares de famílias, mas também uma referência mundial em sustentabilidade e rastreabilidade de produtos orgânicos. A quebra dessa cadeia, provocada pela interrupção das exportações, coloca em risco um sistema produtivo consolidado e reconhecido internacionalmente.
Sem alternativas rápidas de renegociação com os Estados Unidos ou a implementação efetiva de políticas de compensação financeira, especialistas alertam para um colapso em curto prazo. A estagnação de um setor que vinha em franca expansão ameaça desestruturar o campo, o comércio exterior e a imagem do mel brasileiro no mercado global.