A proposta de tornar obrigatória a contratação de seguro rural para produtores que desejam acessar o crédito agrícola com subsídios públicos marca um novo capítulo na política de financiamento do agronegócio brasileiro. Prevista para ser anunciada até setembro, a medida será voltada à safra 2025/26 e pretende transformar o Plano Safra em um instrumento mais eficaz diante das incertezas climáticas cada vez mais frequentes.
Ao atrelar a obtenção de crédito à contratação de seguros, o governo pretende reduzir perdas financeiras, fortalecer a resiliência da produção e oferecer mais segurança tanto aos produtores quanto às instituições financeiras. A iniciativa visa, sobretudo, criar um ambiente mais previsível e estável para o setor, promovendo uma mudança de cultura na gestão de riscos no campo.
Um avanço com obstáculos de infraestrutura
A iniciativa tem potencial para reestruturar a relação entre risco e financiamento agrícola, mas não está livre de desafios. Para a Howden Re Brasil, divisão especializada em resseguros da multinacional Howden, a proposta é estratégica, mas exige cuidado na implementação.
Arthur Sanches, diretor de contratos da empresa, avalia que o novo modelo pode ser benéfico, desde que haja um reforço simultâneo na estrutura das seguradoras e resseguradoras atuantes no país. “O objetivo do governo com essa medida é tornar o acesso ao crédito agrícola mais barato. O seguro, nesse contexto, oferece proteção contra eventos que podem comprometer a capacidade de pagamento ao agente de crédito”, explica. Ou seja, o mecanismo funciona como um escudo financeiro que beneficia todas as partes envolvidas — desde o produtor até os bancos.
Contudo, para que essa engrenagem funcione, é indispensável expandir a capacidade operacional do setor de seguros rurais, que ainda enfrenta limitações importantes, especialmente no que diz respeito à cobertura para pequenos e médios produtores.
Seguro paramétrico: agilidade e redução de custos
Uma das inovações estudadas no novo desenho do programa é o uso mais disseminado do seguro paramétrico, baseado em variáveis climáticas — como volume de chuva ou temperatura — em vez da comprovação direta das perdas. Esse modelo vem sendo cada vez mais debatido no mercado por seu potencial de democratizar o acesso ao seguro, graças à agilidade na indenização e ao custo mais acessível.
“Essa modalidade baseia-se em parâmetros predefinidos para determinar o pagamento de indenizações, sem a necessidade de avaliação individualizada das perdas”, afirma Sanches. O formato, além de simplificar a contratação, promove maior transparência e rapidez, especialmente em situações de emergência climática. Ele é especialmente atrativo para produtores de menor porte, que muitas vezes encontram barreiras para acessar o seguro tradicional, seja por custo ou burocracia.
Oferta limitada pode ameaçar viabilidade da proposta
Apesar dos benefícios esperados, a expansão da demanda por seguros, causada pela vinculação com o crédito rural, pode pressionar a estrutura atual do mercado segurador. Se a capacidade de cobertura não acompanhar o ritmo da demanda, há risco de encarecimento e até de exclusão de parte dos produtores do sistema, justamente os mais vulneráveis.
“Com uma demanda maior que a oferta, os preços tendem a subir, já que os vendedores podem cobrar mais devido à escassez”, alerta o especialista da Howden Re. Dessa forma, a proposta só alcançará seus objetivos se for acompanhada por políticas públicas que incentivem a ampliação da capacidade de seguradoras e resseguradoras no país. Sem isso, o resultado pode ser inverso ao desejado: aumento de custos, redução de acesso e insegurança ainda maior no campo.