Resumo
Obra Cupins da América do Sul reúne 58 pesquisadores e traz o estudo mais completo já publicado sobre esses insetos na região neotropical.
O livro aborda desde a biologia e evolução dos cupins até seu papel essencial na manutenção dos ecossistemas tropicais.
Apesar de apenas 3% das espécies causarem danos urbanos, a maioria atua como engenheira do solo e decompositora de matéria vegetal.
A publicação destaca a importância dos cupins na infiltração da água, no sequestro de carbono e na regulação ambiental.
Disponível gratuitamente pela UFABC, o livro busca aproximar ciência e sociedade, desmistificando a imagem negativa dos cupins
Embora sejam frequentemente lembrados como vilões da madeira em ambientes urbanos, os cupins exercem um papel essencial na manutenção dos ecossistemas tropicais.
Agora, a complexidade biológica, ecológica e evolutiva desses insetos sociais é finalmente retratada com profundidade em uma nova obra científica de acesso gratuito: Cupins da América do Sul, um marco na literatura entomológica produzido por dezenas de pesquisadores e lançado com apoio da UFABC e da FAPESP.
Uma obra monumental que amplia a compreensão sobre os insetos sociais
Reunindo o trabalho de 58 especialistas de sete países, a publicação compila o que há de mais atualizado sobre os cupins da região neotropical, com ênfase especial no território brasileiro. São ao todo 879 páginas distribuídas em 29 capítulos, resultado de anos de colaboração científica que começou ainda em 2019, durante o V Simpósio de Termitologia.
A proposta surgiu a partir da constatação de uma lacuna: até então, não havia um material abrangente que reunisse a diversidade de conhecimentos sobre esses insetos, especialmente do ponto de vista ecológico e evolutivo. O último título com relevância internacional datava de 2002 — e mesmo esse, limitado ao estudo das espécies consideradas pragas.
Além de apresentar aspectos taxonômicos e fisiológicos, o livro avança em discussões sobre o papel ecológico dos cupins, como sua contribuição na decomposição de matéria vegetal, no armazenamento de carbono e na manutenção da umidade do solo. Muitos desses tópicos, inclusive, são fruto direto de pesquisas apoiadas por projetos financiados pela FAPESP ao longo da última década.
Engenheiros do solo e agentes de equilíbrio ambiental
Embora menos de 3% das espécies sejam responsáveis por prejuízos em áreas urbanas, os cupins ainda carregam o estigma de inimigos invisíveis das construções. No entanto, essa visão limitada ignora a grandiosidade de seu papel ecológico.
Com quase 3 mil espécies identificadas em todo o mundo — sendo 623 presentes na América do Sul —, esses insetos atuam como verdadeiros engenheiros do solo. São capazes de modificar a estrutura física e química do ambiente onde vivem, favorecendo o crescimento de plantas, a infiltração da água durante enchentes e a retenção de umidade em períodos de seca. Em pastagens naturais com cupinzeiros, por exemplo, os solos demonstram maior capacidade de absorção hídrica, o que influencia diretamente no equilíbrio da flora local.

Além disso, são os principais decompositores de biomassa vegetal no subsolo, contribuindo diretamente para o sequestro de carbono. Parte desse carbono, ao ser ingerido pelos cupins, é armazenado em seus corpos — reduzindo temporariamente sua emissão na atmosfera. Ainda que liberem metano durante esse processo, a presença de microrganismos metanotróficos nos seus sistemas digestivos ajuda a mitigar esse impacto ao transformar o metano em CO₂.
Mais comunicação, menos preconceito
O livro também abre espaço para a discussão sobre a importância de se comunicar a ciência ao público leigo. Um dos capítulos se dedica a estratégias de divulgação científica centradas nos cupins, apresentando projetos como o Wikitermes, que atua com linguagem acessível em escolas, redes sociais e eventos de educação ambiental.
A ideia é simples, mas urgente: ao entender o papel funcional dos cupins na natureza, cresce a consciência sobre sua importância e, por consequência, diminui o preconceito. Esse esforço é fundamental especialmente em países tropicais como o Brasil, onde a biodiversidade dessas espécies é imensa — e onde grande parte dos prejuízos causados pelas chamadas “pragas urbanas” decorre de espécies exóticas introduzidas, que, fora de seus ecossistemas de origem, encontram pouca competição e se tornam dominantes.
Essas espécies, originárias de países como Chile, Peru e de regiões asiáticas, desempenham funções ecológicas relevantes em seus habitats nativos, como a regulação de populações arbóreas. No ambiente urbano brasileiro, contudo, a ausência de predadores naturais favorece sua proliferação descontrolada, gerando prejuízos que contribuem para sua má reputação.
Conhecimento acessível para mudar paradigmas
Mais do que um compêndio técnico, Cupins da América do Sul é um convite à reinterpretação de um grupo frequentemente subestimado. A obra está disponível gratuitamente para download no site da Editora da UFABC e pode ser consultada por estudantes, professores, pesquisadores ou qualquer leitor interessado em compreender melhor os ciclos da natureza e o papel dos insetos em sua engrenagem silenciosa.
Com linguagem clara e rica em dados, a publicação oferece não apenas um panorama atualizado da termitologia sul-americana, mas também reforça o valor do conhecimento acessível, do diálogo entre ciência e sociedade e da valorização da biodiversidade.



