Em meio aos desafios crescentes da conservação ambiental, um dos problemas que avança de forma silenciosa é a proliferação de plantas aquáticas invasoras. Disfarçadas por uma aparência delicada, essas espécies escondem um potencial destrutivo para os ecossistemas de água doce. Ao cobrir rios, lagos e represas com densos tapetes vegetais, elas bloqueiam a luz solar, diminuem os níveis de oxigênio e sufocam a biodiversidade nativa — afetando, diretamente, atividades humanas como o abastecimento de água, a pesca artesanal e o turismo ecológico.
É nesse cenário que a Universidade Estadual de Maringá (UEM) ganha destaque ao integrar duas iniciativas internacionais voltadas ao controle dessas espécies. Ambas as pesquisas são financiadas por programas científicos da Comissão Europeia e promovem uma rara articulação entre instituições de países como Itália, Canadá, Portugal, Áustria, Bélgica, Croácia e Romênia, além do Brasil. O foco comum? Compreender profundamente o comportamento das plantas invasoras e desenvolver soluções eficazes para frear sua expansão.
Pesquisas colaborativas para entender a dispersão das espécies
Uma das frentes de atuação se concentra no projeto “Prevendo a diversidade funcional de plantas aquáticas exóticas invasoras”, que tem como objetivo mapear a capacidade adaptativa dessas espécies em diferentes ambientes. A proposta é liderada pelo professor Rossano Bolpagni, da Università degli Studi di Parma (Itália), e conta com a participação de Lars Iversen, da McGill University (Canadá), além dos brasileiros Sidinei Magela Thomaz e Roger Paulo Mormul, ambos do Departamento de Biologia da UEM.
As análises são desenvolvidas por meio de coletas de campo e experimentos laboratoriais conduzidos pela doutoranda Alice Dalla Vecchia, que circula entre três países — Itália, Canadá e Brasil. Em sua última passagem por aqui, foi acompanhada por três colegas da Universidade de Parma para realizar a etapa brasileira da pesquisa, com atividades coordenadas pelo Nupélia (Núcleo de Pesquisas em Limnologia, Ictiologia e Aquicultura) e pelo Programa de Pós-Graduação em Ecologia de Ambientes Aquáticos Continentais (PEA) da UEM.
Segundo o professor Roger Paulo Mormul, o problema é mais grave do que aparenta. “Essas plantas entopem os cursos d’água, expulsam espécies nativas e comprometem a integridade desses ecossistemas. Isso afeta diretamente os serviços que a água doce nos oferece, como o lazer, a pesca e o consumo humano”, explica o pesquisador. Além disso, parte dos experimentos ocorre em locais estratégicos como os reservatórios de hidrelétricas e a base do Nupélia em Porto Rico (PR), com apoio da bióloga Aline Rosado e do técnico Valmir Alves Teixeira.
O projeto tem duração de três anos e inclui uma abordagem inovadora: a Ciência Cidadã. A ideia é envolver a população no monitoramento das espécies invasoras, criando uma rede de observadores que ajude a identificar rapidamente novos focos. “As descobertas não ficarão restritas aos laboratórios. Pretendemos desenvolver ferramentas de alerta precoce que auxiliem na tomada de decisões e na implementação de medidas preventivas eficazes”, reforça Mormul.
BUILDERS: ciência cidadã e comportamento animal no centro das ações
Além desse projeto, a UEM também é a única instituição brasileira presente no consórcio internacional BUILDERS – sigla para Building Resilience Through Citizen Science-Driven Approaches to Invasive Species. Coordenada pela professora Cristina Castracani, da Universidade de Parma, a iniciativa busca transformar a forma como o mundo lida com espécies invasoras ao unir Ciência Cidadã, Comportamento Animal e Monitoramento Biológico.
Com início previsto para 1º de novembro e vigência até 2029, o BUILDERS reúne onze instituições — entre acadêmicas e não acadêmicas — de sete países e conta com investimento superior a 4,5 milhões de reais pelo programa europeu Marie Skłodowska-Curie Actions, dentro do Horizon Europe. Embora a UEM não receba verbas diretas, o projeto prevê intercâmbio científico intenso, com a vinda de aproximadamente 20 pesquisadores europeus ao Paraná ao longo dos próximos quatro anos.
Para Mormul, que coordena a iniciativa no Brasil, essa articulação é essencial para pensar soluções em escala. “O projeto tem a ambição de transformar a maneira como lidamos com as espécies invasoras, superando barreiras de conhecimento que dificultam seu controle”, observa.
Tecnologia, ciência e engajamento: as bases para uma resposta global
Com atuação integrada entre instituições de ponta e envolvimento direto da sociedade, os dois projetos em andamento na UEM são exemplos concretos de como o conhecimento científico pode gerar impacto real na gestão ambiental. As pesquisas não apenas fortalecem o protagonismo da ciência brasileira no cenário global, como também oferecem insumos para a criação de políticas públicas, planos de manejo e estratégias de prevenção contra uma das maiores ameaças aos nossos ecossistemas hídricos.
Afinal, diante do avanço das espécies exóticas, a melhor defesa é a informação — bem fundamentada, compartilhada e construída com a participação ativa da sociedade.



