Resumo
A bióloga Bianca Bonami Rosa está catalogando árvores nativas do Cerrado no campus da UFU e compartilhando o projeto nas redes sociais para valorizar a flora brasileira.
O perfil @rosadecerrado no Instagram divulga mais de 50 espécies nativas com linguagem acessível, promovendo a educação ambiental por meio da ciência e da estética.
O Cerrado, conhecido como “floresta invertida”, tem árvores com raízes profundas que ajudam no equilíbrio hídrico e são ideais para paisagismo urbano sustentável.
Bianca critica o uso de espécies exóticas na arborização e defende um paisagismo que respeite o bioma local, com ipês, mulungus e outras árvores nativas.
O projeto pretende se expandir para outros campi da UFU e inspira moradores a plantarem espécies do Cerrado, com orientação sobre onde encontrar mudas.
Entre prédios acadêmicos, calçadas e estacionamentos, o Cerrado resiste em silêncio. Suas árvores, muitas vezes confundidas com mato ou “vegetação qualquer”, seguem florescendo discretamente pelos cantos da cidade — até que alguém resolva prestar atenção. Foi o que fez Bianca Bonami Rosa, bióloga, mestre em Ecologia e apaixonada por tudo o que nasce, cresce e se transforma nas paisagens do Brasil central.
Desde 2022, ela percorre o Campus Santa Mônica da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) com um olhar atento e uma missão: identificar e valorizar as espécies nativas do Cerrado, mostrando que o bioma tem muito a oferecer — em beleza, biodiversidade e soluções sustentáveis para o paisagismo urbano. O resultado é um catálogo vivo e poético, que ganha forma no perfil do Instagram @rosadecerrado.
Do anonimato à celebração: as árvores ganham identidade
Com o projeto, o que antes passava despercebido entre bancos de concreto e canteiros aparados, agora é nomeado e celebrado: pitanga, jenipapo, cedro, mama-cadela, imbiruçu, sangra-d’água, entre outras espécies nativas que revelam a riqueza da flora regional. Mais de 50 delas já foram catalogadas, com direito a registros visuais, vídeos explicativos e curiosidades compartilhadas com linguagem acessível nas redes.
O nome do perfil, aliás, mistura ciência e afeto: faz alusão à planta Kielmeyera rubriflora, conhecida como rosa-do-cerrado, e também homenageia o próprio sobrenome da criadora. O gesto resume a proposta do projeto — misturar conhecimento técnico com sensibilidade estética, conectando ciência, arte e pertencimento.
Paisagismo que nasce da terra, não de catálogos importados
Para Bianca, o modelo de paisagismo urbano ainda é colonizado por padrões estéticos importados, que privilegiam espécies exóticas como palmeiras imperiais, magnólias e resedás. Essas plantas, apesar do apelo visual, não pertencem ao nosso clima nem à nossa ecologia, e muitas vezes excluem ou sufocam espécies nativas.
“Temos no Cerrado uma diversidade de árvores espetaculares, adaptadas ao nosso solo e clima, que merecem espaço nas cidades. Usar plantas da própria região é mais econômico, mais ecológico e muito mais significativo”, defende Bianca em um dos vídeos publicados no perfil.
Entre os destaques da flora local estão os ipês de diversas colorações — verde, branco e pelo menos sete tons de amarelo — além dos mulungus, com suas flores vibrantes em laranja e vermelho. Esses exemplares não só encantam visualmente, como favorecem a presença de polinizadores e contribuem para o equilíbrio do ecossistema urbano.
Uma floresta sob os pés: a genialidade do Cerrado
O Cerrado é conhecido por abrigar árvores de porte médio e aparência tortuosa, mas o que impressiona está no subsolo. Suas raízes profundas, que podem atingir até 15 metros de profundidade, fazem parte de uma engenharia natural complexa: além de acessar lençóis freáticos nas estações secas, essas estruturas absorvem o impacto de queimadas e contribuem com a recarga dos aquíferos.
Bianca ressalta que essa característica — chamada por muitos de “floresta invertida” — também torna essas árvores ideais para o meio urbano. “Diferente de espécies de raízes superficiais, as nativas do Cerrado não comprometem calçadas ou estruturas, o que as torna excelentes para arborização pública e privada.”
Educação ambiental que toca e transforma
Com vídeos que unem rigor científico e sensibilidade, Bianca aposta na divulgação acessível como ferramenta de mudança. Sem jargões, ela explica a importância das espécies, o impacto da destruição do bioma e os caminhos para reverter a invisibilidade do Cerrado nas cidades.
“O conhecimento técnico precisa sair do laboratório e chegar às pessoas. Quando entendem o valor de uma árvore nativa, elas passam a enxergar o entorno com mais respeito — e isso muda tudo”, afirma. A lógica é simples: ninguém protege o que não conhece.
Mudas, memórias e futuro plantado
Além do trabalho no campus, Bianca também orienta quem deseja incluir espécies nativas no paisagismo de suas casas. Para isso, ela recomenda buscar mudas nos viveiros do Instituto Estadual de Florestas (IEF), que atuam em diferentes cidades de Minas Gerais — entre elas, Uberaba, Patos de Minas e Ituiutaba. Embora o comércio de plantas exóticas ainda predomine, os viveiros públicos são aliados fundamentais na reintrodução da flora nativa em áreas urbanas.
A longo prazo, o projeto deve se expandir para os demais campi da UFU, consolidando um mapeamento completo da vegetação nativa presente na universidade. Ao mesmo tempo, a ideia é educar pela presença: fazer das árvores — com ou sem flor, torcidas ou retas — protagonistas de uma nova narrativa urbana.