Entre os campos vastos e os cerrados que marcam o Matopiba, uma transformação silenciosa vem mudando o futuro da agricultura. O consórcio entre lavoura e pecuária, conhecido como ILP, desponta como a estratégia mais eficiente para aumentar a produtividade, devolver saúde ao solo e garantir a sustentabilidade dessas paisagens.
Estudos da Embrapa Meio-Norte comprovam que esse arranjo inteligente, que integra grãos e animais num ciclo fechado, traz benefícios que vão muito além da colheita: ele fixa carbono, melhora a fertilidade e prepara a terra para o futuro.
O papel da integração na qualidade do solo
Em avaliação criteriosa, a equipe da Embrapa analisou o comportamento de sistemas integrados e comparou-os a áreas de pastagem e vegetação nativa do Cerrado. Como explica o pesquisador Edvaldo Sagrilo, a principal virtude dessas práticas está em potencializar o solo como um verdadeiro sumidouro de carbono.
“Com o manejo adequado, o pecuarista que cuida da pastagem e o agricultor que adere à integração conseguem resultados ambientais e produtivos muito parecidos”, ressalta o especialista.
Ao longo da pesquisa, foram observadas concentrações muito mais altas de substâncias húmicas em áreas integradas, um indicador direto da qualidade e da capacidade de retenção de água e nutrientes no solo. Essas substâncias são indispensáveis para a estruturação do solo e a manutenção da atividade biológica, o que garante uma lavoura mais vigorosa e resiliente.
Impactos ambientais e produtivos
A elevação dos estoques de carbono e nitrogênio, segundo Sagrilo, representa uma oportunidade tanto ambiental quanto econômica. Além da redução das emissões, há maior economia de insumos e menor perda de fertilidade, o que significa solo fértil por mais tempo e menos custos para o produtor. Nesse cenário, o mercado de créditos de carbono ganha força e promete recompensar financeiramente os produtores que adotarem essas práticas sustentáveis.
Dados que impressionam
A pesquisa foi executada em São Raimundo das Mangabeiras (MA), comparando cinco sistemas: vegetação nativa, ILPF consolidado há 13 anos, ILP há 16 anos sob plantio direto, ILP com preparo recente e pastagens cultivadas há 15 anos. O resultado foi inequívoco: os maiores estoques de carbono estão exatamente nos sistemas integrados e nas pastagens bem conduzidas. O salto foi significativo — 84% a mais para o ILP com plantio direto, 108% para o ILP com aração e 66% para pastagens, quando comparados à vegetação nativa.
Esse ganho também depende do tempo e do cuidado com o solo, uma vez que as áreas nativas são originalmente pobres em nutrientes, o que reforça a importância da adoção dessas práticas.
Testemunho do campo
Fernando Devicari, produtor em Brejo (MA), sabe bem o valor do consórcio lavoura-pecuária. Após 15 anos investindo no ILP e nove no ILPF, ele viu o solo voltar a respirar.
“A palhada que antes sumia na chuva agora vira alimento para a terra. Com a rotação entre milho e capim, a matéria orgânica dobrou e a produtividade disparou. Hoje, colhemos quase oito sacas a mais por hectare”, conta o agricultor.
Potencial além do Matopiba
Ainda que o estudo tenha sido focado nessa fronteira agrícola, Sagrilo lembra que os impactos positivos são replicáveis em outras áreas do Cerrado. Pesquisas em diferentes regiões confirmam que o manejo integrado, quando bem planejado e executado, é capaz de transformar solos frágeis em solos ricos, aumentar a produção e, de quebra, contribuir para a redução das emissões globais.
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