Com suas flores em forma de sinos coloridos, a dedaleira — cientificamente conhecida como Digitalis purpurea — é frequentemente admirada por seu apelo estético. Suas inflorescências se erguem como torres floridas, abrindo-se de baixo para cima com um charme que costuma encantar jardineiros e paisagistas. No entanto, por trás dessa aparência ornamental, a planta guarda um segredo: seus compostos naturais atuam diretamente sobre o coração humano, e o uso incorreto pode levar a consequências sérias para a saúde.
Originária das florestas europeias, a dedaleira foi introduzida em outras regiões por intervenção humana e hoje pode ser encontrada em jardins de altitude na América Central e do Sul. Segundo a farmacêutica-bioquímica e pesquisadora em toxicologia vegetal Celina Rocha, o que torna essa planta tão peculiar é justamente sua capacidade de sintetizar glicosídeos cardiotônicos, substâncias que influenciam a contração do músculo cardíaco. “Esses compostos são extraídos das folhas da dedaleira e, em doses controladas, podem auxiliar no tratamento de arritmias e insuficiência cardíaca”, explica.
Aliás, por muito tempo, medicamentos derivados da Digitalis foram utilizados em hospitais no mundo todo. A digoxina, por exemplo, é um dos princípios ativos mais conhecidos extraídos da planta e pode melhorar a força com que o coração bombeia sangue. Ainda assim, a margem entre a dose terapêutica e a dose tóxica é extremamente estreita — o que torna seu uso clínico cada vez mais restrito e cuidadosamente monitorado.
O uso medicinal exige cuidado extremo
Ainda que os digitálicos — como são chamadas essas substâncias — ofereçam benefícios em determinadas condições, o consumo da dedaleira sem prescrição médica pode causar intoxicações graves, alerta a cardiologista clínica Renata Bastos Oliveira, membro da Sociedade Brasileira de Cardiologia. “O coração é altamente sensível aos digitálicos. Quando administrados de forma inadequada, esses compostos podem provocar desde náuseas e visão embaçada até bloqueios cardíacos que exigem intervenção com marca-passo”, afirma.

Entre os efeitos mais perigosos da intoxicação digitálica está o chamado bloqueio atrioventricular total — uma falha completa na condução elétrica do coração que, em casos graves, pode levar à morte súbita se não houver socorro imediato. Por isso, mesmo que a planta pareça inofensiva no jardim, não deve jamais ser ingerida ou utilizada em chás e extratos caseiros.
Grupos de risco e contraindicações
A dedaleira é especialmente perigosa para pessoas com condições pré-existentes, como idosos, pacientes com disfunção renal e aqueles com níveis baixos de potássio no sangue. Nesses casos, o risco de intoxicação é ainda mais alto, mesmo com pequenas doses. “Quem já apresenta um ritmo cardíaco lento ou usa outros medicamentos que afetam o coração pode sofrer efeitos colaterais mais rapidamente”, reforça Dr.ª Renata.
Além disso, a automedicação com plantas de propriedades potentes pode mascarar sintomas ou atrasar o diagnóstico correto de doenças cardiovasculares. Caso haja recomendação médica para o uso de medicamentos com base em digitálicos, é fundamental acompanhar os níveis da substância por meio de exames de sangue e manter um controle rigoroso da dosagem.
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