No coração do semiárido brasileiro, onde o verde desaparece nos meses de estiagem e a luta por alimento para o rebanho se intensifica, uma planta vem se destacando como solução estratégica para a pecuária regional. A gliricídia (Gliricidia sepium), leguminosa originária da América Central, não apenas sobrevive à seca: ela floresce onde muitas outras espécies sucumbem.
Cultivada em áreas castigadas pela falta de chuva, a gliricídia se firmou como uma alternativa sustentável, nutritiva e acessível — sobretudo após demonstrar, em experimentos da Embrapa Semiárido, um desempenho surpreendente durante a seca histórica de 2013, em Sergipe. Ali, enquanto outras culturas murchavam, ela manteve sua produção, provando ser uma aliada resiliente para os produtores da região.
Adaptação, proteína e produtividade em uma só planta
Diferentemente de outras forrageiras que exigem irrigação constante ou custosos insumos, a gliricídia apresenta uma tolerância notável à seca prolongada, crescendo mesmo em solos menos férteis e sob altas temperaturas. Essa rusticidade é combinada com um alto valor nutricional: a planta pode atingir até 22% de proteína bruta, uma quantidade considerável para a alimentação animal, especialmente em momentos de escassez de pasto.
Além disso, a gliricídia se destaca por sua capacidade de rebrote vigoroso, o que permite múltiplos cortes ao longo do ano. Em sistemas irrigados, é possível colher o primeiro volume de forragem após apenas quatro meses do plantio. Já em áreas de sequeiro, embora o tempo de espera seja maior, a planta responde bem após o estabelecimento inicial das raízes. A cada corte, novos brotos surgem com ainda mais força — uma característica que favorece o manejo rotativo e a silagem caseira.
Economia no cocho e autonomia para o produtor
A diferença prática para o produtor é evidente não só no campo, mas também no bolso. O custo de produção da silagem de gliricídia é significativamente inferior ao de concentrados tradicionais como o farelo de soja, sem abrir mão da qualidade nutricional. Em números, estima-se que 8 quilos de gliricídia ensilada contenham o dobro de matéria seca e a mesma quantidade de proteína que 1 quilo de farelo de soja, por menos da metade do custo.
Essa economia se soma a outra vantagem crucial para o semiárido: a autonomia produtiva. Ao cultivar gliricídia em suas próprias terras, o pecuarista pode reduzir a dependência de insumos externos e contar com um alimento seguro, estável e abundante ao longo do ano. Mesmo em períodos mais secos, a planta continua entregando massa verde suficiente para manter a dieta do rebanho, especialmente quando combinada a outras culturas forrageiras como a palma.
Um manejo simples para um resultado estratégico
O cultivo da gliricídia não exige tecnologias complexas. O plantio deve ser feito preferencialmente no início da estação chuvosa, respeitando o espaçamento adequado para o desenvolvimento das raízes. Em pouco tempo, a planta se consolida e começa a oferecer uma produção volumosa de biomassa, que pode ser cortada e armazenada em silos ou oferecida in natura.
Seu potencial ainda vai além da forragem. Por ser leguminosa, a gliricídia fixa nitrogênio no solo, contribuindo para o enriquecimento natural da terra e favorecendo o cultivo consorciado com outras espécies — como demonstrado nos testes da Embrapa, que combinaram a planta com a palma forrageira em um sistema complementar de alimentação.