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Ferramenta criada na Unesp promete antecipar enchentes e ampliar a segurança em Lençóis Paulista
Publicado
2 dias atrásem
Por
Claudio P. Filla
Resumo
• Um sistema desenvolvido na Unesp usa dados de radar meteorológico e simulação do solo para prever riscos de enchentes em Lençóis Paulista.
• A ferramenta surgiu após a enchente histórica de 2016 e busca antecipar cenários críticos antes que ocorram novos alagamentos.
• O modelo considera não apenas a chuva, mas também a saturação do solo, fator decisivo para a ocorrência de inundações.
• O índice gerado varia de zero a um e traduz, de forma simples, a probabilidade de alagamento em diferentes períodos do ano.
• Previsto para ficar online em 2026, o sistema deve apoiar a população e o poder público na prevenção de desastres climáticos.
Na madrugada de janeiro de 2016, Lençóis Paulista viveu um dos episódios mais traumáticos de sua história recente. Em poucas horas, um volume extremo de chuva rompeu represas, fez o Rio Lençóis transbordar e transformou bairros inteiros em corredores de água. Casas foram tomadas até o telhado, centenas de famílias precisaram deixar suas residências e os prejuízos se espalharam muito além do impacto material imediato. Desde então, outros alagamentos importantes se repetiram, revelando um padrão preocupante para uma cidade que convive com cursos d’água e áreas de várzea.
É a partir desse histórico que surge uma resposta científica com potencial de mudar a relação entre chuva intensa e risco urbano. Um sistema de previsão de enchentes desenvolvido na Faculdade de Ciências da Unesp, em Bauru, em parceria com o Instituto de Pesquisas Meteorológicas, foi pensado justamente para antecipar cenários críticos e oferecer informações claras à população e ao poder público.
Ciência aplicada ao cotidiano urbano
Diferentemente de alertas baseados apenas na quantidade de chuva prevista, o novo modelo considera um fator decisivo e muitas vezes invisível: a condição do solo antes e durante os eventos de precipitação. Afinal, nem toda chuva intensa resulta em inundação, assim como nem todo alagamento exige volumes extremos. O ponto-chave está na capacidade de infiltração e armazenamento de água ao longo da bacia hidrográfica.
O sistema cruza dados de radar atmosférico — capazes de mapear a distribuição e a intensidade da chuva em tempo quase real — com uma modelagem física do solo que simula, dia após dia, como a água se acumula, infiltra ou evapora. Dessa interação nasce um índice numérico, chamado Índice de Probabilidade de Inundação, que varia de zero a um e traduz, de forma objetiva, o risco de enchente em determinado momento.
Por que o radar faz diferença
Em regiões onde a rede de pluviômetros é limitada ou inexistente, como ocorre em parte da bacia do Rio Lençóis, o radar meteorológico se torna uma ferramenta estratégica. Ele funciona emitindo ondas eletromagnéticas que retornam após atingir as gotas de chuva na atmosfera, permitindo estimar onde e quanto está chovendo. Esse recurso reduz custos operacionais e amplia a cobertura espacial, algo fundamental para cidades médias que não dispõem de sistemas complexos de monitoramento hidrológico.
No caso de Lençóis Paulista, essa abordagem se mostrou especialmente eficaz, pois contorna a ausência de medições diretas no solo e ainda permite acompanhar a evolução das chuvas de forma contínua, inclusive durante eventos mais rápidos e intensos.
O papel silencioso do solo nas enchentes
Além disso, o modelo incorpora uma simulação detalhada do comportamento do solo ao longo do tempo. Mesmo áreas rurais, muitas vezes vistas como menos vulneráveis, podem alagar quando o solo atinge seu limite de saturação. Já em zonas urbanas, onde o asfalto e o concreto predominam, a resposta é quase imediata: a água escoa rapidamente para rios e galerias, elevando o risco de transbordamento.
A simulação considera características locais, como tipo de solo, temperatura, vento e histórico recente de chuvas, reconstruindo virtualmente as condições da bacia desde 2016. Com isso, o índice não avalia apenas o evento isolado, mas todo o contexto hidrológico que o antecede.
O índice na prática
Durante períodos secos, comuns no inverno paulista, o índice costuma permanecer em valores baixos, indicando risco reduzido. Já nos meses chuvosos de verão, quando o solo permanece úmido por longos períodos, os valores sobem de forma consistente. Nos testes retrospectivos, o pico máximo do índice coincidiu justamente com a enchente histórica de 2016, reforçando a capacidade do sistema de identificar situações críticas.
Mesmo não sendo infalível — como qualquer ferramenta de previsão ambiental —, o modelo apresentou alta taxa de acerto, especialmente quando comparado às limitações de infraestrutura existentes na região. Em alguns episódios mais recentes, índices elevados não se converteram em alagamentos, o que revela outro aspecto importante do sistema: ele também é sensível às intervenções humanas.
Infraestrutura urbana e ajustes constantes
Obras de ampliação de represas e melhorias na capacidade de retenção de água alteram a dinâmica da bacia hidrográfica. Isso significa que, ao longo do tempo, o volume de chuva necessário para causar uma inundação pode aumentar. O sistema reconhece essa realidade e exige calibração contínua, incorporando mudanças estruturais e novos dados para manter sua precisão.
Esse diálogo entre ciência e planejamento urbano é um dos pontos fortes do projeto, pois transforma o índice não apenas em uma ferramenta de alerta, mas também em um indicador da eficácia das políticas públicas adotadas.

Sou Cláudio P. Filla, formado em Comunicação Social e Mídias Sociais. Atuo como Redator e Curador de Conteúdo do Agronamidia. Com o apoio de uma equipe editorial de especialistas em agronomia, agronegócio, veterinária, desenvolvimento rural, jardinagem e paisagismo, me dedico a garantir a precisão e a relevância de todas as publicações.
E-mail: [email protected]

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